sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Pelas ruas de Atami

  «Quando estava em Atami, em Setembro de 2012, presenciei esta cena na rua por pura coincidência (ver vídeo). Eu estava a percorrer a marginal a pé na companhia de duas pessoas de Atami, que me estavam a indicar onde estavam plantados os jacarandás que foram oferecidos à cidade pela cidade por Cascais (no âmbito de uma geminação). Eu pretendia ver se os jacarandás ali em Atami estavam floridos, isto porque eu própria vivi muitos anos numa rua de Lisboa cheia deles. O pavimento coberto de lilás e o cheiro da flor são boas recordações para mim. Estava eu então muito contente porque algumas das árvores estavam floridas, e ia filmá-las. As minhas companheiras de passeio estavam a explicar-me que a cidade planeava estender o corredor de jacarandás na marginal, porque alegadamente ficavam todos maravilhados com a época em que floriam intensamente.

   É então que oiço um cântico budista. Conhecia-o muito bem por o ter ouvido noutros lugares onde já tinha passado, mas não esperava uma demonstração daquelas naquele lugar tão...urbano. O monge estava à porta de um estabelecimento comercial com o seu traje de noviço. Em certos sectos budistas os monges fazem uma oração a troco de um donativo. No entanto os meus estudos de religiões do extremo-oriente tinham-me ensinado que esse momento é muito privado: a loja está a ser espiritualmente purificada. Como resistir a filmar? Acabei por inventar uma estratégia menos invasiva. Mantive-me à distância, em silêncio, e no momento em que a lojista se aproxima da porta desviei a câmara, não violando a privacidade da interacção entre ambos nem o momento de recepção da esmola por parte do monge. Assim, as flores do jacarandá acabaram por ser o interlocutor deste pequeno filme, o que acabei por apreciar muito. As flores abertas nas árvores e o seu destino inevitável no chão, pintalgando-o de violeta, pareciam-me então a analogia perfeita para aquele momento. 

  Na vida que passa, no tempo que urge, na marginal que se moderniza, ainda há flores e orações, não estivesse eu no Japão.»


Inês Carvalho Matos
Comissão organizadora - Namban 南蛮 1543-2013



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